Como encantar 4 bilhões de viajantes?
O francês Benoît Domenget, presidente da Sommet Education, de formação de executivos de hospitalidade, revela as novas tendências da clientela e do setor

Até o final deste ano, o transporte aéreo mundial terá registrado 4 bilhões de embarques de passageiros. Ou 297 passageiros por segundo. É gente que precisa se hospedar. Para tanto - e os números continuam superlativos - hotéis e o conjunto da indústria da hospitalidade reúnem 290 milhões de empregos.

Os dados são mencionados por Benoît-Etienne Domenget, presidente da Sommet Education, uma organização para a formação de executivos muitíssimos qualificados para o setor, com duas instituições e suas oito escolas em seis diferentes cantos do mundo (três na Suíça e mais uma no Reino Unido, na Espanha, Estados Unidos, China e Jordânia).
Para uma entidade desse tamanho, o curioso não está apenas em seu desempenho como negócio. É a radiografia que ela é capaz de obter da evolução e das tendências de um ramo da economia que surgiu há pouco mais de dois séculos.
Foram os hotéis que, depois de um quarto e uma cama, incorporaram como conforto a eletricidade e os elevadores, o rádio de cabeceira, a água quente e a televisão, restaurantes e mais o luxo e a internet.
Em verdade, diz Domenget, em entrevista ao Diário do Comércio, falava-se em apenas hotelaria até três décadas atrás. O conceito foi ampliado.
Quando se menciona mais amplamente o setor de hospitalidade, estão em jogo serviços - recepção, emissários - também presentes em embarcações de cruzeiro, varejo de luxo, bancos e shopping centers.
GRUPO COM O DNA NA SUÍÇA
O grupo Sommet ("cúpula", em francês) teve como ponto de partida duas tradicionais escolas suíças de hotelaria, a Glion, fundada em 1962, e a Les Roches, um pouco mais antiga, de 1954.
Elas passaram recentemente para o controle do grupo francês de investimento Eurazeo, com a incorporação das demais escolas.

Domenget afirma que o objetivo da formação dos alunos - sete semestres de cursos e estágios, todos no idioma inglês - responde à demanda de instituições de padrão elevado.
Os alunos investem um alto preço em si mesmos - US$ 45 mil por ano nas escolas suíças, 30 mil euros na Espanha.
Isso com aulas, refeições e alojamento em regime de internato. É o custo equivalente ao de boas universidades americanas.
Mas o retorno é proporcional, pois em média cada estudante recebe, ao fim do curso, 3,4 ofertas de emprego. A empregabilidade é de 100%, e a qualificação se resume, grosso modo, à equipe de direção de um hotel de grande porte ou de outra empresa de hospitalidade.
A seleção de estudantes é feita por meio de provas em que, ao lado do bom nível acadêmico, fornecido pela conclusão do curso secundário, prevalecem o conhecimento do idioma inglês e, por meio de entrevistas, a mensuração da ambição de prestar bons serviços.
Benoît Domenget argumenta que o sucesso dessa formação profissional está bastante ligado à capacidade adaptá-la às novas tendências do mercado.
Ele cita o caso da geração que está hoje com a idade entre 25 e 35 anos, com um poder aquisitivo elevado pela rápida ascensão das classes médias no Leste Europeu, Sudeste da Ásia ou países dos Brics (Brasil, Índia, China e Rússia).
Alguém com esse perfil etário sente-se "esperto" (e não socialmente desprestigiado) ao comprar passagens de companhias aéreas de baixo custo, como a Easy Jet. Consome produtos luxuosos, mas não procura apenas marcas. Quer algo que traga uma identidade cultural com a qual sinta afinidades.
NACIONALISMO E ORIGEM DOS ALIMENTOS
Um exemplo. Um bom hotel não é aquele cujo luxo é pasteurizado - a mesma decoração em qualquer canto do mundo. É aquele que tenha na decoração produtos do artesanato local, que sirva alimentos cuja origem o hóspede se interessa em verificar.
Estamos um pouco distantes, diz Domenget, do hóspede que nos anos 1970 viajava de primeira classe, hospedava-se em hoteis cinco estrelas e se alimentava em restaurantes resenhados pelo Guia Michellin. Há a partir de agora uma sensível guinada de perfil.
O presidente do grupo Sommet cita ainda o exemplo das lojas Chang Xia, abertas na China pelo grupo europeu Hermès. Existem, é óbvio, peças de roupas idênticas e ao mesmo preço de uma loja parisiense. Mas há também produtos altamente trabalhados em bambu - característica do mercado chinês - ou de outros fornecedores locais.
A geração Y ou Millennial, prossegue Domenget, também redescobriu uma forma rudimentar de nacionalismo.
Em lugar de se posicionar como um consumidor indistinto de produtos globais, ela valoriza o que é produzido por seu país de origem, e é em razão desse atributo que, por exemplo, a etiquetagem dos alimentos traz bem visível a nacionalidade.
Tais valores estão presentes também no fato de um hóspede se comportar como alguém que, se viajou a negócios, também se preocupa com a cultura e o entretenimento permitido pela imersão em valores locais.
O binômio "business/pleasure" (a negócios ou por prazer) deu lugar ao neologismo "bleasure" para explicar a aparição dessa ambiguidade.
O que, aliás, também acontece com os grandes hotéis-cassinos americanos de Las Vegas, que se transformaram em imensos hoteis familiares, em que as roletas são apenas um condimento ao lado do entretenimento para as crianças.
Em resumo, diz Domenget, o mercado da hospitalidade se modificou, e muito. Associações do setor demonstram isso internacionalmente por meio de estudos frequentes.
Mas as temperaturas das tendências também são captadas pelos termômetros da formação dos executivos que assumem hotéis e outros estabelecimentos do setor.
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FOTOS: Divulgação/Sommet Education