Depois da posse, os primeiros desafios do novo governo
Bolsonaro vai necessitar de uma consistente base no Congresso para aprovar a maioria das promessas de campanha

Transformar o capital eleitoral em apoio parlamentar se impõe como desafio para o novo presidente, que se elegeu com um discurso disruptivo, antissistema, antipolítica e antipartidos.
Mas Bolsonaro vai necessitar de uma consistente base no Congresso para aprovar a maioria das promessas de campanha. Ao receber a faixa presidencial de Temer, ele receberá também um País melhor do que o seu antecessor encontrou.
Os primeiros seis meses são considerados decisivos. Bolsonaro aposta nos dois principais nomes de sua equipe: Paulo Guedes, no Ministério da Economia, e Sérgio Moro, na Justiça e Segurança Pública.
A eleição de Bolsonaro impulsionou os filhos nas urnas. Eduardo, o mais novo dos três irmãos políticos, foi reeleito deputado federal com a maior votação da história do País. O primogênito, Flávio, conquistou uma vaga ao Senado, mas viu seu nome no centro do episódio do Coaf.
Alvo de um atentado a faca durante a campanha, o novo presidente prometeu no discurso da vitória pacificar do País, mas seus subordinados mantêm o radicalismo nas redes sociais em temas como diplomacia internacional e questões morais.
Expediente do decreto
Sob o argumento de que é preciso construir "um novo Brasil", com menos Estado e mais produtividade, o presidente Jair Bolsonaro usará o expediente do decreto, logo nos primeiros dias de governo, para mudar portarias ministeriais, instruções normativas e até resoluções, sem passar pelo crivo do Congresso.
"O nosso compromisso é tirar o governo do cangote dos cidadãos", disse ao Estado o novo ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. "Desfazer a burocracia não depende do Congresso. Só depende da canetada do presidente."
O núcleo duro do governo Bolsonaro está preparando um pacote de iniciativas que, no diagnóstico de Onyx, terão como meta "simplificar a legislação existente e favorecer a atividade econômica, do pequeno ao grande empreendedor".
A adoção do modelo de decretos para assegurar a rápida entrada em vigor dos projetos de interesse do Palácio do Planalto - e revogar iniciativas vistas como "obstáculo" ao crescimento - começou a tomar forma a três dias da posse de Bolsonaro.
O novo vice-presidente, general Hamilton Mourão, avalia que o governo precisa aproveitar o capital político dos primeiros seis meses da gestão - período conhecido como "lua de mel" - para investir na comunicação com a sociedade e "traduzir" medidas até agora consideradas amargas, como a reforma da Previdência.
Bem humorado, o general chegou a citar o personagem Giovanni Improtta, bicheiro que fez sucesso na novela Senhora do Destino, para definir a necessidade de urgência no encaminhamento das propostas. "O tempo ruge e a Sapucaí é grande", afirmou ele, caindo na gargalhada.
As alterações no sistema de aposentadoria são classificadas como essenciais para a busca do equilíbrio das contas públicas e para transmitir aos investidores a mensagem de austeridade fiscal.
Nos bastidores, até mesmo aliados de Bolsonaro, porém, veem o prazo de 180 dias como "limite" para que o governo faça "concessões" aos partidos, sob pena de ter sua vida transformada em um inferno na Câmara e no Senado.
Na prática, embora o presidente tenha traçado diretrizes para os primeiros cem dias - com foco na redução do déficit público e melhoria do ambiente de negócios, além da promessa de cortar 30% dos cargos comissionados -, a tendência é que haja entraves no Congresso.
O primeiro teste da nova direção do Planalto no Congresso será a eleição para o comando das duas Casas, marcada para 1.º de fevereiro. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disputa novo mandato, mas não tem o respaldo do PSL.
O governo também fará tudo para derrotar Renan Calheiros (MDB-AL), candidato à presidência do Senado. Em conversas reservadas, interlocutores de Bolsonaro afirmam que Renan não inspira confiança porque tem "canal direto" com o PT.
"Eu defendo candidatura própria do PSL na Câmara e no Senado ainda estamos discutindo", afirmou o deputado Major Olímpio (PSL-SP), que é senador eleito.
Maia jura que não condicionará qualquer acordo com o PSL à pauta da Câmara, caso seja reconduzido ao cargo. A portas fechadas, no entanto, um integrante do novo primeiro escalão criticou a articulação política de Bolsonaro e não escondeu que teme uma espécie de "revanche" dos descontentes no Congresso.
"Ninguém vai defender mais a agenda econômica de Bolsonaro do que eu", disse Maia ao Estado. "Eu acredito e vou defendê-la onde eu estiver. Estão criando interpretações que não existem."