A contaminação política da tributação

“Utilizar imposto de importação como barreira comercial era algo impensável... o governo Trump II, contudo, levou esse entendimento ao rés-do-chão"

Everardo Maciel
05/Set/2025
Ex-secretário da Receita Federal, é consultor jurídico e professor do Instituto Brasiliense de Direito Público
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A contaminação política da tributação

A tributação moderna parecia ter afastado qualquer vinculação a interesses estritamente políticos. Nestes turbulentos tempos, porém, houve um significativo retrocesso.

Utilizar imposto de importação (“tarifas”) como barreira comercial era algo impensável desde os tratados que resultaram na instituição da Organização Mundial do Comércio. O governo Trump II, contudo, levou esse entendimento ao rés-do-chão.

Embora incida sobre os nacionais do país tributante, as tarifas de Trump vão promover relevantes e imprevisíveis reestruturações nas cadeias de comércio internacional. Seu fundamento já não é mais apenas econômico. Agora, é também político. Parodiando Von Clausewitz, a tributação passou a ser a guerra por outros meios.

Ainda que de forma distinta, a contaminação política da tributação chegou até nós. Não bastasse a adoção do surrado jargão “pobres contra ricos”, presumível razão para as crescentes transferências de domicílio fiscal para o Exterior, um episódio recente evidencia o mau uso da política tributária.

A Receita expediu, em 17.09.25, a Instrução Normativa (IN) nº 2.219, consolidando e aperfeiçoando normas relativas à prestação de informações sobre operações financeiras de interesse fiscal, em conformidade com sistemática em vigor desde a Lei Complementar nº 105, de 2001.

Em janeiro passado, decidiu-se dar desproporcional publicidade à inclusão de informações relativas a transações por meio do PIX, o que gerou uma onda de desconfiança e desinformação.

Por receio de impopularidade, a reação do governo àquela onda consistiu em revogar a consistente IN e editar a MP nº 1.288, cujos 5 artigos “esclarecem” que o PIX é administrado pelo Banco Central e que sobre ele não incidem tributos, como se em algum momento incidira. A MP, inepta desde sua edição, sequer foi apreciada pelo Congresso.

A bem-sucedida operação “Carbono Oculto”, que enfrentou a presença do crime organizado no setor de combustíveis, tornou evidente que não é necessária emenda constitucional para promover articulação operacional entre fisco, polícia e Ministério Público, especialmente porque ela prevê a instituição de novos fundos constitucionais a engessar o já sobrecarregado orçamento público. Ensejou, todavia, a oportunista edição da IN nº 2.278, de 29.08.25, que, de forma dissimulada e acanhada, reabilita a revogada IN nº 2.219.

Dizia o pensador Norberto Bobbio: “A ideia de que tudo seja política é simplesmente monstruosa”. É preciso restabelecer a índole republicana da tributação.

 

IMAGEM: DC

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