OAB-SP cria comissão para garantir segurança jurídica aos pequenos negócios

Iniciativa, encabeçada pela advogada especialista em Direito Empresarial Lúcia Bludeni, tem como foco principal a reforma tributária e será desenvolvida para traduzir a linguagem jurídica de forma prática para os empreendedores não serem surpreendidos pelas novas exigências

Karina Lignelli
26/Set/2025
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OAB-SP cria comissão para garantir segurança jurídica aos pequenos negócios

A criação da Comissão de Direito das Micro e Pequenas Empresas na OAB-SP sinaliza um movimento estratégico da entidade diante de um dos maiores desafios para o ambiente de negócios no Brasil: a adaptação desse segmento à reforma tributária.

Embora os pequenos negócios respondam por mais de 90% da geração de empregos e movimentação econômica do país, ainda enfrentam grandes barreiras de acesso a serviços jurídicos e de orientação técnica para lidar com as complexidades da legislação.

Ao instituir a nova comissão - uma das poucas do tipo no país - a Ordem sinaliza que o tema ganha peso institucional. A iniciativa nasce de uma articulação da advogada especialista em Direito Empresarial e Terceiro Setor Lúcia Bludeni, conselheira estadual da OAB-SP. Ela, que deve assumir a presidência da Comissão e dialoga diretamente com o Sebrae, mostra que o pano de fundo é claro: a reforma tributária, que exigirá mudanças profundas nos mecanismos de controle fiscal e poderá alterar até a viabilidade do Simples Nacional para determinados setores.

Na prática, a Comissão pretende atuar em duas frentes. A primeira, de natureza acadêmica e legislativa, vai aprofundar estudos sobre os impactos das mudanças tributárias e contratuais. A segunda, mais prática, pretende fornecer orientações acessíveis para o dia a dia dos empreendedores, muitas vezes sobrecarregados pela rotina de gestão e com pouco tempo ou preparo técnico para lidar com exigências fiscais cada vez mais digitalizadas. “A ideia é traduzir a linguagem jurídica de forma prática, para que os empreendedores tenham segurança e não sejam surpreendidos pelas novas exigências”, afirma Lúcia.

A expectativa é que a instalação oficial da Comissão ocorra ainda neste ano, em evento organizado pela OAB-SP. A iniciativa também busca resgatar um papel histórico. "Essa também é uma responsabilidade social, e a OAB tem um ônus público por ser a casa do Direito e da cidadania. É com esse viés que pensamos a atuação da Comissão para apoiar as pequenas empresas."

A seguir, confira os principais pontos da entrevista com Lúcia Bludeni:

 

Diário do Comércio - Como surgiu essa demanda para tratar do Direito voltado às micro e pequenas empresas? 

Lúcia Bludeni - A demanda surgiu de uma conversa com o Sebrae, que está empenhado em gerar um apoio a mais para esses micro e pequenos empreendedores. Principalmente nesse novo cenário tributário, que, a partir do ano que vem, estará a pleno vapor. 

 

Foi a reforma tributária que deu o start à criação da Comissão?  

Lúcia - Junto com outros advogados, criamos há 14 anos uma Comissão de Direito do Terceiro Setor para estruturar o segmento dentro da OAB-SP, e atuamos muito na legislação atinente a essas organizações. Hoje, com o cenário que se apresenta, decidimos, dentro da Ordem, criar uma comissão temática com foco específico nas micro e pequenas empresas. 

Essa é uma visão mais macro da OAB, que se preocupa inicialmente em ser uma casa de Direito e cidadania. Também tem como missão institucional cuidar da profissão dos advogados, sua atuação em ramos específicos e, dentro desse segmento de pequenas empresas, tratar não só da legislação atinente a elas, mas do impactos que a legislação jurídica pode gerar no âmbito contratual, fiscal, contábil e tributário. 

A atuação lege ferenda (em processo de elaboração) tem essa força de, juntamente com outras entidades, impulsionar com um olhar atual essa adequação ao momento em que a gente vive - especialmente para as micro e pequenas empresas, que nasceram com a LC 123/2006. No cenário que se apresenta, vamos atuar dentro da OAB para desenvolver capacitação e estudos mais aprofundados dentro do Direito com esse foco e, paralelamente, contribuir com outros atores e instituições voltadas ao segmento, como o Sebrae, para promover uma atuação legislativa eficiente e mais eficaz para atendê-las.  

 

A OAB-SP será uma das poucas seccionais no Brasil que terá essa Comissão (hoje, existem três: no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Santa Catarina). Além dos estudos jurídicos, como será essa atuação de forma prática?

Lúcia - É sabido que essas micro e pequenas empresas atuam de forma exponencial no país, respondem por mais de 90% da movimentação no sentido do empreendedorismo, de fazer negócios, de arrecadação, de geração de empregos... Não é um segmento a se desprezar. Daí a importância de fomentar esses estudos, essa atuação legislativa no sentido de aperfeiçoamento, de orientação, porque o que já está posto com a reforma tributária acende novamente esse farol para um olhar mais cuidadoso, pela adaptação que essas empresas vão sofrer com a mudança, porque estão no regime do Simples. 

Com a reforma tributária, a necessidade de adequação dessas empresas às formas de controles fiscais, que hoje existem por meio de plataformas que exigem submissão de dados, vai tomar mais tempo do pequeno empreendedor, porque acessá-las muitas vezes vai depender de um advogado para esse assessoramento e, inevitavelmente, de um contador. Hoje, elas têm uma forma de pagamento tributário simplificado, mas, com a reforma, vão precisar avaliar se vale a pena se manter no Simples.

 

Como essa Comissão deve funcionar?

Lúcia - Vamos trabalhar no sentido de esmiuçar o segmento, seja no âmbito jurídico, seja com o auxílio de entidades da área contábil, como o próprio Sebrae, para fomentar e buscar estudos mais concretos e valiosos para este momento, em especial com a reforma tributária, para saber qual o impacto que essa reforma pode trazer para as micro e pequenas empresas, caso a caso, para cada tipo de atividade, pois pode ser necessário rever toda a operação delas. 

 

É uma espécie de apoio à gestão?

Lúcia -  Isso. [Para adaptar] a atividade empresarial e seus vários subitens, seja produto, seja serviço, tudo aquilo que envolve a operação e a entrega ao destinatário, as cadeias, vai ser preciso validar tudo nesse novo contexto. Saber onde pode cortar custos, onde pode melhorar a eficiência, o que pode fazer para deixar a empresa saudável, e não apenas embarcar na reforma tributária. Vai ser necessário fazer um estudo prévio, é obrigatório fazer previamente esses estudos.

Aí é que nós entramos com o Sebrae e com as entidades das áreas contábil e jurídica, para avaliar esses impactos e definir de que forma poderemos, por meio dos estudos que estão sendo desenvolvidos, o melhor caminho a ser adotado. Não vai ser uma consultoria jurídica, pois nós trabalhamos de forma genérica, mas um estudo de temas específicos com olhar para as MPEs.

 

Os pequenos negócios têm uma certa resistência em procurar apoio jurídico? Quais os principais entraves? 

Lúcia - Não é só por falta de conhecimento que eles não buscam assessoria contábil e jurídica adequadas. Muitas vezes eles até caem na sonegação e não por má-fé, mas por despreparo. Porque o pequeno empreendedor é uma figura que atua em toda a empresa, e o tempo dele é muito escasso. A operação demanda muito tempo para ele, e às vezes fica inviável dar conta de tudo, até por falta de compreensão técnica e legislativa, por isso ele precisa desse apoio técnico, jurídico e fiscal, para ter segurança jurídica e tributária nos negócios e para não ser surpreendido, não deixar para depois sem se preparar para a reforma tributária, porque isso cria uma bola de neve irreversível. Isso aumenta a responsabilidade fiscal. O Fisco tem inúmeros mecanismos para cruzar dados e pegar erros que podem levar a uma autuação que pode até comprometer os negócios.

Por isso a Comissão que está sendo estruturada tem a pretensão de adotar uma postura muito próxima desse segmento empresarial para auxiliá-los em um primeiro momento com informações, com os impactos dessas novas diretrizes. 

 

Quais as expectativas com essa nova comissão, e quando ela começa a funcionar? 

Lúcia - A primeira expectativa é de, na primeira quinzena de novembro, realizar um evento na OAB-SP para oficializar a instalação da comissão por iniciativa da gestão do presidente Leonardo Sica e da vice-presidente Daniela Magalhães. A segunda é se relacionar com outras comissões dentro da própria OAB, pois temos muitos pontos em comum em várias áreas do Direito, além de concentrar dentro da comissão diversos eixos de atuação do microempreendedor, dar uma atenção muito especial a esse segmento que, apesar da capilaridade, não tem faturamento muito alto, a própria pessoa física é que está à frente do segmento, e precisa ter mais tranquilidade para trabalhar, mais certeza jurídica, saber se está no caminho certo. Informação de qualidade, ainda mais de organismos técnicos, nunca é demais - principalmente para ajudar o segmento. 

Hoje, as operações são feitas de forma padronizada nas plataformas, com dados claros e validadas automaticamente. Mas muitas dessas pequenas empresas não detêm e não utilizam essa tecnologia no próprio controle diário de compras, vendas e pagamentos. Por isso, além de sistemas de gestão (ERPs), eles precisam de soluções básicas. Nossa pretensão na OAB-SP é 'fatiar' a comissão em vários microtemas, de uma forma salutar e em uma linguagem jurídica muito simples e que pode ser aplicada no dia a dia da pequena empresa. Essa também é uma responsabilidade social, e a OAB tem um ônus público por ser a casa do Direito e da cidadania. É com esse viés que pensamos na atuação da comissão para apoiar as pequenas empresas. 

 

IMAGEM: arquivo pessoal

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