Visitamos a única residência projetada por Oscar Niemeyer nos EUA
Casa, que é marco da arquitetura e foi construída na década de 1960, está à venda desde maio por US$ 20 milhões, em Santa Monica, região de Los Angeles

Em meio ao agito do mercado imobiliário na região de Los Angeles (sul da Califórnia) nos últimos meses, uma oferta chama a atenção. O endereço é icônico e a importância da residência faz jus a ele. A chamada Strick House, construída em 1964 e colocada à venda em maio deste ano, é a única residência e uma das únicas duas obras do arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer na América do Norte (a outra é o prédio das Nações Unidas em Nova York). A construção foi designada como “Marco da Cidade” no ano de 2003 e está anunciada por US$ 19,995 milhões.
Solicitamos uma visita aos corretores no início de junho mas, infelizmente, na data desejada, a rua estava interditada para obras de manutenção de infraestrutura. Foi preciso voltar na semana seguinte e, só então, sem caminhões e furadeiras impedindo a visão, pudemos finalmente ver a fachada da casa e sua excelente localização.
Ela fica na La Mesa Drive, endereço em Santa Monica repleto de projetos de relevância arquitetônica desenhados por nomes como Richard Neutra e Rudolph Schindler. É uma rua larga, repleta de árvores centenárias dos seus dois lados, que harmonizam perfeitamente bem com as residências.
A casa desenhada por Niemeyer tem traços inconfundíveis, linhas retas, farta luz natural, e remete muito às suas outras obras. São 460 metros quadrados, cinco quartos e seis banheiros, possui pé direito alto, de 4,2 metros, paredes de vidro e vista para o Riviera Country Club. No entorno da piscina, jardins tropicais exuberantes e um paisagismo que impressiona. Tudo muito bem integrado e condizente com a decoração interna. Até a biblioteca, repleta de exemplares, que foi adicionada ao projeto vários anos depois, conversa perfeitamente com o conjunto.
Mas a obra vale não apenas pelo visual. Sua história é igualmente rica.
Modernismo brasileiro era moda na Califórnia
De acordo com o instituto de preservação de patrimônio Santa Monica Conservancy, no final dos anos 1950 e início dos anos 1960, “o modernismo brasileiro era muito popular e voltado para o futuro”, fazendo sucesso no mundo e inspirando projetos na Califórnia. Oscar Niemeyer era admirado por seus projetos de Brasília, inaugurada em 1960. Um de seus admiradores era o roteirista, produtor e cineasta norte-americano Joseph Strick que, ao lado de sua esposa, a escritora Anne Strick, resolveu encomendar o projeto da casa na La Mesa Drive.

O arquiteto brasileiro, porém, não era bem-visto por autoridades dos Estados Unidos por conta de sua atividade política na época, e teve seu visto para ir ao país negado. O projeto precisou ser concluído à distância.
Pouco depois da conclusão da obra, o casal Strick se separou e a residência ficou com Anne até 2001, quando foi vendida a uma construtora por cerca de US$ 3 milhões. A empresa pretendia demolir a casa, mas teve que desistir do plano depois de protestos de historiadores e organismos locais. O imóvel então foi vendido aos arquitetos e designers Michael e Gabrielle Boyd, em 2003. No mesmo ano, o endereço recebeu o título de “Marco da Cidade” e passou por uma restauração, promovida pelos novos proprietários.
Eles fizeram pequenas mudanças, preservando o estilo e buscando, sempre que possível, evocar o design original de Niemeyer e as características de seus trabalhos no Brasil. Foi adicionada a biblioteca de pé-direito duplo à construção e a casa foi toda decorada com móveis de época da coleção dos Boyds. O endereço se tornou palco de encontros de acadêmicos de arquitetura.
Niemeyer, no entanto, nunca voltou para ver o resultado de sua obra. Ele morreu em 2012, aos 104 anos. De acordo com Boyd, alguns anos antes de falecer, o arquiteto viu fotos da casa reformada publicadas na revista Architecture Digest.

Agora, os atuais proprietários resolveram adquirir e restaurar uma outra casa também no sul da Califórnia e, por isso, colocaram o imóvel histórico à venda. Eles estão aproveitando o bom momento do setor.
Mercado aquecido
Alguns meses depois dos incêndios catastróficos que devastaram uma imensa área entre Malibu e Santa Monica, na região de Los Angeles, o mercado imobiliário local está superaquecido, com atividade intensa e disparada nos preços. O desastre destruiu propriedades de celebridades como Paris Hilton, Mel Gibson, Anthony Hopkins e Miles Teller, e forçou mais de 13 mil famílias a se mudarem.
Segundo relatório da Douglas Elliman, imobiliária especializada em alto padrão, as vendas totais de imóveis nas regiões próximas às zonas afetadas pelos incêndios no primeiro trimestre de 2025 aumentaram 25,2% em relação ao ano anterior. Já no segmento de luxo, a alta foi de 28,9% na mesma comparação. As maiores expansões foram detectadas justamente nas localidades de Santa Monica, Venice, West Hollywood e Century City, com crescimento de mais de 80% nas vendas de casas unifamiliares.
O estudo mostra que a oferta também aumentou 47,7% em toda a região.
“Como está o mercado imobiliário em Los Angeles? Resiliente, ativo e cheio de energia”, afirma a corretora especializada em imóveis de alto padrão Rayni Romito Williams. Segundo ela, “mais de duas dúzias de casas foram vendidas por US$ 20 milhões ou mais no primeiro trimestre de 2025, logo após os incêndios de janeiro, e 310 casas foram vendidas por valores entre US$ 5 milhões e US$ 11 milhões”.
E não são somente os proprietários da casa projetada por Oscar Niemeyer que estão aproveitando esse boom imobiliário. Andar à procura de casas luxuosas na região de Los Angeles pode levar os interessados a outras “pechinchas” de celebridades. O ator Chris Evans, conhecido pelo papel de Capitão América, por exemplo, colocou a residência dele, localizada ali perto, em Hollywood Hills, à venda. Ele está pedindo US$ 6,995 milhões pelo imóvel de quase 430 metros quadrados, com quatro quartos e cinco banheiros, construído na década de 1940 e totalmente reformado. Alguém se interessa?
IMAGENS: MLS/divulgação