Não vê quem não quer
"Quando os avaliadores analisam potenciais líderes, eles inconscientemente comparam os candidatos com um modelo interno de como um líder 'deveria' ser, e esse modelo tende a ser mais velho"

Marina Pimenta (nome fictício) tinha 32 anos quando foi preterida para um cargo de diretora na sua empresa de marketing em São Paulo. Apesar de ter liderado a sua equipe em campanhas recordistas e de ter obtido um MBA num programa de excelência, o cargo foi para uma pessoa de 45 anos com resultados menos impressionantes. A explicação do seu chefe? "Precisamos de alguém com mais gravitas."
A experiência da Marina reflete uma realidade preocupante: os jovens em torno dos 30 anos enfrentam um teto de liderança que não tem nada a ver com as suas habilidades.
A barreira não tem a ver com competência — estudos sugerem que os jovens líderes muitas vezes superam os seus colegas mais velhos na promoção de mudanças e inovações. O problema está na percepção. Quando os avaliadores analisam potenciais líderes, eles inconscientemente comparam os candidatos com um modelo interno de como um líder "deveria" ser, e esse modelo tende a ser mais velho.
Esse fenômeno, chamado de incongruência de papéis, cria um viés sistemático. Os jovens profissionais são avaliados com notas mais baixas em qualidades essenciais de liderança, como competência e confiabilidade, não porque lhes faltem essas características, mas porque os observadores não conseguem enxergar além da idade deles. O viés se intensifica quando os avaliadores são mais velhos, criando um ciclo vicioso em que líderes mais velhos selecionam líderes mais velhos.
As consequências são graves. Os jovens profissionais enfrentam avaliações mais severas, maior escrutínio com menos recursos e reações negativas de subordinados mais velhos. Eles internalizam essas dúvidas externas, desenvolvendo autopercepções negativas sobre as suas capacidades de liderança.
Comparemos com a construção do prédio Palácio Gustavo Capanema, reinaugurado no mês passado no Rio de Janeiro. Foi encomendado por quem deu-lhe o nome quando o ministro Capanema tinha só 30 anos e confiou a construção a um time coordenado pelo arquiteto Reidy quando este tinha 28 anos. Reidy foi mais tarde construir o Museu de Arte Moderna no Rio de Janeiro. Até hoje, ambos os prédios são emblemáticos do Rio de Janeiro e indelevelmente associados a pessoas que tinham 30 ou menos anos.
Vale comparar o caso da Marina com o do Reidy porque as organizações que abraçam a diversidade etária na liderança têm um desempenho consistentemente superior ao de suas concorrentes, beneficiando-se de perspectivas mais amplas e abordagens inovadoras. As empresas que excluem sistematicamente os jovens talentos não estão apenas sendo injustas — estão sendo estrategicamente tolas.
Organizações com visão de futuro estão começando a lidar com esse preconceito por meio de processos de avaliação cega, programas de mentoria que emparelham jovens líderes com mentores seniores e incluindo explicitamente a diversidade etária em iniciativas de inclusão. A solução não é baixar os padrões, mas reconhecer que o potencial de liderança não vem com os cabelos grisalhos, nem com calças, nem com qualquer outra coisa que queira se argumentar.
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