ACSP: Vacância em espaços comerciais de fachadas ativas de SP chega a 80%
Santa Cecília, Vila Madalena e Perdizes têm maior proporção de empreendimentos nesse modelo urbanístico, e Vila Mariana sustenta o maior índice de esvaziamento, de acordo com pesquisa encomendada pela entidade

Mais de uma década depois do resgate do conceito de fachada ativa na cidade de São Paulo, trazido pelo Plano Diretor de 2014, o que se vê, na maioria das vezes no térreo desses edifícios, ainda são espaços desocupados.
Uma pesquisa encomendada pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP), por meio de seu Conselho de Política Urbana (CPU), ao escritório de arquitetura Campagner Arq & Urb, mostra que, apesar de o Plano Diretor oferecer incentivos e, em alguns casos, até obrigar a construção de lojas na fachada de novos empreendimentos, a iniciativa ainda não vingou.
Na Avenida Rebouças, 63% dos espaços de fachadas ativas estão vagos, enquanto na Avenida Ibirapuera, esse número sobe para 70%. A Vila Mariana lidera o índice de vacância, com 80% dos espaços desocupados. Neste último caso, 40% estão alugando ou vendendo e outros 40% estão desocupados.
A pesquisa focou em 391 empreendimentos em três áreas de alta renda na zona Sudoeste da capital - as Avenidas Rebouças e Ibirapuera e a Vila Mariana. Desse total, 91 empreendimentos contavam com fachadas ativas. O estudo também analisou um universo mais amplo de 1.162 prédios residenciais construídos até 2023 na cidade, dos quais 218 (18,8%) incluíam esse tipo de estrutura.
Apesar da alta taxa de desocupação, o material aponta o crescimento no número de prédios com fachadas ativas mais recentemente. Entre 2006 e 2023 foram construídos 300 empreendimentos com fachadas ativas na cidade de São Paulo, sendo que a grande maioria, 283 (ou 94,33% do total) apareceram entre 2016 e 2023, dois anos após o mais recente Plano Diretor resgatar esse modelo.
Usos observados - Além disso, o estudo aponta um padrão claro de locação: as marcas que mais se interessam por esses espaços são grandes redes de varejo com capacidade de investimento e operações padronizadas, como minimercados. Entre elas, Oxxo, Casa Bauducco, Minuto Pão de Açúcar, Carrefour, Multicoisas e o banco Itaú. Pequenas clínicas, centros estéticos e estúdios de práticas esportivas também aparecem nessa lista.
Outro ponto observado no estudo mostra que, à medida que a oferta desses espaços comerciais aumentou, houve também um aumento nos valores de aluguel, o que pode estar dificultando a ocupação por comerciantes que antes estavam alocados em infraestruturas mais baratas na mesma região. O estudo indica, portanto, como desafio, reequilibrar a oferta desses espaços comerciais de forma a ajustar os preços de locação.
Beatriz Messeder, coordenadora técnica do CPU, lembra que o Plano Diretor da cidade de São Paulo passou por revisão em 2023 e que nele foram feitos ajustes técnicos quanto ao uso de fachadas ativas. Entre as alterações estão a proibição do uso de fachadas ativas para instalação de guarda de bens (conhecidos como self storage) e a permissão para a fachada estar localizada em diferentes andares da edificação, desde que seja garantido acesso da população a todos os níveis.
"Nos projetos mais recentes, já vemos um cuidado maior por parte das construtoras antes de conceber os empreendimentos para entender o tipo de uso que aquele espaço pode ter. Nem todo prédio, nem toda região, tem essa vocação", disse.
Antonio Carlos Pela, vice-presidente da ACSP e coordenador do CPU, ressalta a importância da pesquisa sobre um modelo muito presente em São Paulo, mas que ainda enfrenta dificuldades para atrair lojistas. Nas palavras de Pela, a obtenção desses dados organizados de forma sistemática ajuda a entender os desafios de aprimoramento desse instrumento para que sejam propostas melhorias e ações futuras.
"O CPU se interessou pelo tema porque passou a ser muito questionado. Os comerciantes queriam explicações e uma forma de aproveitar esse instrumento. Esse trabalho não deve se restringir a essa etapa, é algo inicial, e até 2029 estaremos atentos a esse debate", disse Pela.
Vagas de estacionamento - Também responsável pela condução da pesquisa, a urbanista Larissa Campagner diz buscar ainda outros caminhos para que a regulação urbanística possa interagir melhor com o comércio.
"Vemos pela pesquisa que todos gostam da fachada ativa, ela ajuda a vender o empreendimento, mas a única sugestão de melhoria de legislação está na questão das vagas de estacionamento. O que mais podemos melhorar? O varejo também precisa de incentivos. Essa pesquisa mostra que precisamos de novos desdobramentos para ampliar esse diálogo", disse Larissa.
De modo geral, a legislação determina que áreas não residenciais no nível da rua, com acesso direto ao empreendimento, devem ter aberturas visuais e acessos a cada 20 metros. Vagas de estacionamento em recuos de fachada ativa são permitidas em vias sem faixas exclusivas ou corredores de ônibus, desde que ocupem até 20% da área e sejam autorizadas pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET).
De acordo com Beatriz, a pesquisa mostra unanimidade na necessidade de ampliação de vagas de estacionamento. No entanto, poucos empreendimentos as possuem. O material levantou que, no Ibirapuera, por exemplo, apenas 16% atendem a esse requisito.
Exemplos de fachadas ativas em São Paulo
Edifício Santos Augusta
Projetado pelo arquiteto Isay Weinfeld, o Edifício Santos Augusta já entrega a sua localização no nome: ele fica no cruzamento da Alameda Santos com a Rua Augusta e tem como vizinho de frente o Conjunto Nacional, de David Libeskind.
O projeto é uma torre que une espaços comerciais e institucionais, localizada nos fundos do Conjunto Nacional. Inspirado pela praça interna do Conjunto, que faz uma transição suave entre o espaço público e o privado, o arquiteto buscou criar uma conexão entre os dois edifícios. Para isso, a calçada em frente à torre foi alargada, criando uma praça a céu aberto.
Quem atravessa o Conjunto Nacional em direção à Alameda Santos encontra um espaço com jardins e áreas de estar. Essa praça leva ao Edifício Santos Augusta, onde estão o lobby, um café, o teatro e os escritórios. Durante o dia, grandes portas de correr se abrem, unindo a área externa ao térreo do edifício.

Residencial Alameda Jardins
Com dupla entrada e fachada ativa, o Alameda Jardins é um empreendimento multiuso na Avenida Rebouças, finalizado em 2022. Com duas torres - uma de uso residencial e outra corporativo -, o edifício possui um boulevard de acesso de 600 metros quadrados com muitas árvores, obras de arte de Vik Muniz, Laura Vinci, Raul Mourão, Athos Bulcão e Cássio Vasconcelos, todas expostas ao público em geral.
Uma espécie de interligação entre as duas edificações constitui um espaço semipúblico, sem muros ou grades, que permite a livre circulação de pedestres em uma localização movimentada da capital paulista, próximo à estação de metrô Oscar Freire.

Complexo Brascan
No lote em que antes funcionava uma antiga fábrica de chocolates, o Complexo Brascan é hoje um prédio de uso misto, no Itaim Bibi. São 31 pavimentos para flats hoteleiros, 24 pavimentos para conjuntos comerciais, 15 lajes corporativas, centro de convenções, centro comercial, praça de alimentação e seis cinemas.

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IMAGENS: divulgação