Setores afetados pela taxa de Trump pedem reação firme de Lula, mas estratégica
Na última quarta-feira, 9, o presidente dos Estados Unidos anunciou que, a partir de 1º de agosto, os importados brasileiros serão sobretaxados em 50%. Agro e indústria nacionais dizem que não há justificativa comercial para a medida do governo norte-americano

A indústria e o agronegócio nacionais, principais setores afetados pelo tarifaço de 50% imposto pelo governo dos Estados Unidos às exportações brasileiras, consideraram a medida injusta e sem fundamento na realidade. De fato, deixando de lado argumentos políticos elencados pelo presidente Donald Trump, a justificativa econômica para a sobretaxa seria um desequilíbrio na balança comercial entre os dois países, que penderia favoravelmente ao Brasil, o que não é real. Desde 2009 compramos mais do que exportamos aos americanos, que obtiveram superávit comercial de US$ 650 milhões no primeiro trimestre de 2025.
A sobretaxa de 50% aos importados brasileiros foi anunciada na quarta-feira, 9, pelo presidente dos Estados Unidos, com início da vigência marcado para 1º de agosto. O Brasil foi um dos mais de 20 países notificados nesta semana por Trump, por meio de cartas, de que seriam sobretaxados. Mas o percentual aplicado ao Brasil foi o maior.
- África do Sul: 30%
- Argélia: 30%
- Bangladesh: 35%
- Bósnia e Herzegovina: 30%
- Brasil: 50%
- Brunei: 25%
- Camboja: 36%
- Cazaquistão: 25%
- Coreia do Sul: 25%
- Filipinas: 20%
- Indonésia: 32%
- Iraque: 30%
- Japão: 25%
- Laos: 40%
- Líbia: 30%
- Malásia: 25%
- Myanmar: 40%
- Moldávia: 25%
- Sérvia: 35%
- Sri Lanka: 30%
- Tailândia: 36%
- Tunísia: 25%
Na carta enviada ao presidente Lula, Trump cita como justificativa para o tarifaço "centenas de ordens de censura secretas e injustas para plataformas de mídia social dos EUA" e o que classificou como uma "caça às bruxas" que o ex-presidente Jair Bolsonaro estaria sofrendo em razão do processo no qual é réu por tentativa de golpe de Estado.
Na carta o americano afirmou ainda que a balança comercial dos países é "injusta". "Entenda que essas tarifas são necessárias para corrigir os muitos anos de tarifas e barreiras tarifárias e não tarifárias do Brasil", escreveu Trump.
A Amcham (Câmara Americana de Comércio para o Brasil) rebate essa afirmação, apontando que em 2024 a balança de bens e serviços foi superavitária aos Estados Unidos em mais de US$ 29 bilhões. Especificamente sobre a taxação de 50%, em nota, a entidade externou preocupação. “Trata-se de uma medida com potencial para causar impactos severos sobre empregos, produção, investimentos e cadeias produtivas integradas entre os dois países.”
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirmou que não há qualquer fato econômico que justifique uma medida desse tamanho, destacando que “os impactos dessas tarifas podem ser graves para a indústria nacional, que é muito interligada ao sistema produtivo americano.” Ainda segundo a CNI, a prioridade agora é intensificar a negociação com o governo Trump para preservar a relação comercial histórica e complementar entre os países.
A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) defendeu em nota que a soberania do Brasil é inegociável. Segundo a Fiesp, “quando razões não econômicas são usadas para justificar a quebra do regramento comercial e do direito internacional, é importante reafirmar que o Brasil, assim como os Estados Unidos, é uma nação soberana.”
A entidade da indústria paulista lembra que os Estados Unidos têm "relevante superávit" com o Brasil não só na balança comercial, mas também na balança de serviços, onde o saldo a favor dos americanos é ainda maior. A Fiesp conclui a nota manifestando a expectativa de que a diplomacia e as negociações equilibradas prevaleçam, e que o bom senso volte a nortear a relação entre EUA e Brasil, a despeito de ideologias e preferências pessoais.
Para a indústria, os produtos de maior peso na balança comercial com os Estados Unidos são: semimanufaturados de ferro ou aço; óleos brutos de petróleo ou de minerais betuminosos; celulose; e óleos combustíveis e preparações de petróleo.
A FPA (Frente Parlamentar Agropecuária) pede uma resposta "firme e estratégica" ao governo brasileiro. "A nova alíquota produz reflexos diretos e atinge o agronegócio nacional, com impactos no câmbio, no consequente aumento do custo de insumos importados e na competitividade das exportações brasileiras", destacou o grupo.
A FPA diz que os produtos mais afetados pelo tarifaço serão: produtos florestais; carnes; café; suco de laranja; açúcar e etanol; e os produtos de origem vegetal.
A resposta - A embaixadora Maria Luisa Escorel, secretária de Europa e América do Norte, comunicou à embaixada dos Estados Unidos em Brasília que o presidente Lula não receberia a carta encaminhada por Trump anunciando a sobretaxa de 50%. Escorel afirmou que a carta era "ofensiva" e apontou que havia "afirmações inverídicas" sobre o país e "erros factuais" a respeito da relação comercial bilateral.
Ainda na noite de quarta-feira, Lula afirmou que a resposta virá por meio da Lei de Reciprocidade Econômica, aprovada pelo Congresso neste ano. Lula usou as redes sociais para emitir uma mensagem que já havia adotado dias antes: "O Brasil é um país soberano com instituições independentes que não aceitará ser tutelado por ninguém".
A legislação citada por Lula prevê retaliações e a suspensão de acordos comerciais, de investimentos e de obrigações relativas a direitos de propriedade intelectual em resposta a medidas unilaterais adotadas por país ou bloco econômico que impactem negativamente a competitividade internacional brasileira.
Economistas avaliam que, se a taxação aos importados brasileiros se mantiver, o Brasil terá de retaliar. Nesse momento, o governo brasileiro estuda o caminho que irá tomar. A ideia inicial é responder com tarifas a setores estratégicos aos americanos, como a indústria audiovisual e o setor de serviços.
*com agências
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