Rede DIA passa por reestruturação para ser um ‘atacadinho’ de vizinhança

Nas mãos do fundo brasileiro Arila, a rede, com 240 lojas em SP, quer voltar às origens. A proposta, segundo Fábio Farina (foto), CEO da empresa, é oferecer menos serviços, mais produtos com qualidade e com preços justos

Fátima Fernandes
08/Out/2025
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Rede DIA passa por reestruturação para ser um ‘atacadinho’ de vizinhança

Em 2001, quando chegou ao Brasil, uma varejista de origem espanhola desejava inovar no conceito de preço baixo e marcas próprias e chacoalhar o setor supermercadista. Por alguns anos, o desejo foi realizado.

Criada na Espanha, em 1979, pelo grupo varejista francês Promodès, a rede DIA chegou a ter cerca de 1.200 lojas nos Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Bahia e Minas Gerais.

Além do modelo tradicional de franquia, a varejista dava a opção de conversão de mercadinhos de bairro existentes em lojas com a sua bandeira, contribuindo para o processo de expansão.

Anos depois, o DIA, que pertenceu ao grupo francês Carrefour, entrou em uma crise financeira que culminou, em março do ano passado, em um pedido de recuperação judicial. A dívida da empresa era de aproximadamente R$ 1,1 bilhão.

Diante de maus resultados, o grupo espanhol optou por sair do Brasil também no ano passado.

A rede, que já foi controlada por um fundo de investimento russo, o LetterOne, pertence hoje ao fundo de investimento Arila, ligado ao empresário Nelson Tanure.

Agora, nas mãos de um grupo brasileiro, quais são os planos para a rede de supermercado DIA no Brasil?

Fábio Farina, CEO da empresa, com experiência de mais de 30 anos em finanças, diz, em entrevista para o Diário do Comércio, que o plano é simplesmente voltar às origens.

“O DIA significa Distribuição Internacional de Alimentos e nasceu para atender o varejo de proximidade com os clientes, com pouco ou nenhum serviço e preço justo”, afirma Farina.

Para atender ao seu propósito de origem, a rede, hoje com 240 lojas no estado de São Paulo, das quais 45 são franquias, passa por um amplo processo de reestruturação.

Em março do ano passado foram fechadas 320 lojas, além de centros de distribuição. Os pontos que ficaram e o CD em Osasco estão sendo reformados e reinaugurados.

O que deu errado na rede no Brasil, em parte, diz Farina, foi o abandono do modelo original.

Em certos períodos, em sua avaliação, entendimentos iam na direção de que o DIA poderia se transformar em atacado, oferecer serviços de açougue, atender o cliente de alto padrão.

Um ex-executivo da rede, Samuel Vânio Costa Junior, concorda com Farina. Como é possível, diz ele, operar uma loja como a do DIA como se fosse um hipermercado? “Não dá certo”, diz.

Enquanto a empresa manteve viva a essência que fez ela nascer, que é proximidade, preço competitivo, marca própria forte e logística eficiente, diz Costa Junior, ela foi muito bem.

“O futuro do varejo brasileiro passa por modelos mais próximos, mais humanos, mais simples. Não é sobre ter mais metros quadrados, é sobre ter mais significado por metro quadrado. O DIA foi pioneiro nisso e acredito que, com os ajustes certos, pode voltar a ser referência”, diz.

‘Atacadinho’ de bairro

“O foco agora é ser referência no conceito de ‘atacadinho’ de bairro, voltar às origens”, afirma Farina. “Sou apaixonado pelo modelo do DIA em sua essência”, diz Costa Junior.

Com o pedido de recuperação judicial, a rede tem prazo até outubro do ano que vem para iniciar o pagamento do grosso das dívidas. No curto prazo, Farina diz que não há dívidas.

“As dívidas foram equalizadas na recuperação judicial. A situação financeira da empresa hoje é saudável, há dinheiro em caixa e aplicável. As dívidas trabalhistas foram pagas e as demais começam a ser pagas a partir de outubro do ano que vem”, afirma.

A rede enfrentou erros estruturais, diz, problemas com logística e sistemas. “Há seis meses estamos em processo de trocas que vai permitir ter mais lojas e capacidade de abastecimento.”

Para atender melhor às demandas de clientes de vizinhança, as lojas passaram a oferecer diariamente pães, frutas, legumes e verduras frescos.

Uma das características da rede, que está mantida, é ter marca própria com produtos de primeira linha. Dos cerca de 3 mil itens que vende, 800 são com a marca ‘Melhor a Cada DIA’.

Espalhados pelas lojas, a marca está estampada em alimentos, como arroz, feijão, leite, geleias, água de coco, linhas para churrascos, além de produtos de limpeza, higiene e beleza.

“Geralmente, no Brasil, a marca própria é posicionada com preço menor. Nós tratamos como primeira linha em razão da qualidade dos produtos”, afirma.

No Brasil, diz Farina, os produtos para a rede são feitos por indústrias que também produzem marcas conhecidas de primeira linha. Importados também estampam a marca própria da rede.

Os azeites, por exemplo, são trazidos de Espanha, Portugal e Tunísia. Os biscoitos, da Espanha, da Grécia e da Alemanha. E as geleias, da Argentina.

“Hoje em dia, todo mundo produz para todo mundo. A Unilever, por exemplo, tem mais de 400 marcas em seu portfólio”, afirma o CEO.

Perda de poder de compra

Em meio a todo esse processo de reestruturação para preparar a empresa para voltar a crescer, Farina percebe, em conversas com clientes, que o poder de compra do consumidor está encolhendo.

“Isso não é sentido somente em nosso setor, mas em todo o comércio”, afirma.

É comum, diz ele, quando o cliente passa pelo caixa, pedir para tirar um, dois produtos, já que o valor da compra supera o que ele tem condição de pagar.

Também virou comum o cliente avisar o caixa de que, quando o valor bater em R$ 200, por exemplo, encerra-se a compra. O tíquete médio do DIA é de R$ 60.

A inflação, diz Farina, como revelam as falas dos clientes, está corroendo o poder de compra do brasileiro e aumentando a pressão da indústria sobre os lojistas.

“As tabelas de preços estão com a vida mais curta. Em períodos mais estáveis, as tabelas valem por mais tempo. Hoje tem tabela de preço para uma semana”, afirma.

O pagamento do 13º salário, que injeta dinheiro na economia, ajuda o varejo, mas, como tem acontecido nos últimos anos, diz, parte dele se destina ao pagamento de dívidas, o que deve acontecer também neste ano.

Ainda assim, no caso do DIA, o faturamento tem crescido mês a mês desde o início do ano. “Começamos o ano com R$ 140 milhões por mês e já rompemos os R$ 160 milhões, devendo chegar a R$ 170 milhões neste mês”, diz.

Campanha de aniversário

O crescimento deve ser impulsionado também pela campanha de comemoração, neste mês de outubro, de 24 anos de história no Brasil, com a oferta de produtos e distribuição de prêmios.

A cada R$ 50 em compras, o consumidor concorre diariamente a R$ 500, que serão depositados no PicPay, aplicativo que funciona como um banco digital, e a três motos.

Assim como tem ocorrido com todo o varejo, um dos desafios da rede é a falta de mão de obra.

O DIA tem hoje 80 vagas abertas para as mais diversas funções, como vendedor, operador de caixa, gerente de loja. “Os empregados estão dando preferência para o trabalho informal.”

A bandeira levantada pela Apas (Associação Paulista de Supermercados), que defende a flexibilização da jornada de trabalho, com a adoção do modelo de horas, diz ele, pode ser uma alternativa para preencher as milhares de vagas abertas no varejo.

Recentemente, a Apas e a Abras (Associação Brasileira de Supermercados) mencionaram que há cerca de 350 mil vagas para serem preenchidas no setor no país.

Os rumores de que a rede DIA pode novamente trocar de comando continuam fortes no setor. O que se fala é que o empresário Nelson Tanure não tem tanto interesse no mundo do varejo.

Por enquanto, a informação da rede DIA é a de que não há discussões nesse sentido em andamento. O foco é preparar a empresa para voltar a crescer no país.

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IMAGEM: divulgação

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